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O Brasil nos BRICS - e a antiga busca por protagonismo nas relações internacionais

Por  Hiran Mauá Professor e Advogado Mestre em Geografia (UFSCar) Especialista em Relações Internacionais (FESPSP) A Cúpula dos BRICS, recentemente realizada no Brasil (4 a 7 de julho de 2025), oferece um momento oportuno para discutir o atual lugar do país nas relações internacionais: por um lado, constrangido por limitações sistêmicas históricas; por outro, aventurando-se mais corajosamente nas possibilidades que se abrem com as fissuras da hegemonia estadunidense, em busca do tão almejado protagonismo global e da liderança latino-americana. O acrônimo "BRIC" (sigla para Brasil, Rússia, Índia e China) surgiu em 2001, cunhado pelo economista Jim O'Neill em um artigo para clientes da Goldman Sachs. O texto tratava de quatro países que, embora bastante distintos entre si, compartilhavam algumas características fundamentais: a) vastidão territorial (notadamente Rússia, China e Brasil), abundância de recursos naturais, presença geoestratégica relevante e capacidade de expan...

Psicologia e Ideologia

Por  João Paulo Salva Professor da Faculdade de Direito de Itu (FADITU) Mestre em Sociologia (UNICAMP) Psicólogo (PUCCAMP) e Sociólogo (UNICAMP) I É corrente o entendimento de que as subjetividades são formadas por complexas interações com o ambiente. Nesse sentido, todos parecem aceitar que categorias como cultura e sociedade são partes estruturantes dos indivíduos. No entanto, no discurso hegemônico daqueles que atuam com saúde mental, não é incomum o olhar sobre o indivíduo partir de uma perspectiva absolutamente apartada daquilo que era dado como irrefutável: a sociedade. É sobre essa contradição que esta reflexão se propõe a discutir. Profissionais de Psicologia emitem discursos nitidamente contraditórios sobre essa problemática, pois,  se de um lado, afirmam que os sujeitos são seres sociais; por outro, apressam-se em diagnosticar patologias sob um modelo que individualiza o sofrimento como algo sem o referente externo. Um bom exemplo pode ser dado a partir da prolifer...

Sobre Direito e reflexão filosófica

Por João Paulo Salva Professor da Faculdade de Direito de Itu (FADITU) Mestre em Sociologia (UNICAMP) Psicólogo (PUCCAMP) e Sociólogo (UNICAMP) Se é bem verdade que o espanto se encarrega de dar início à Filosofia, é altamente recomendável verificarmos se ainda somos capazes de nos espantar e, por conseguinte, de iniciar a laboriosa atividade de Sísifo. O conhecimento liberta, mas não é imediato aos sentidos e, assim como uma pedra, deve ser carregado nas montanhas da incerteza, com o intuito de acalentar os corações perplexos diante do mundo. A questão se sustenta na medida em que é cada vez mais comum nos depararmos com um questionamento estudantil acerca da utilidade de um determinado conhecimento, sobretudo quando este conhecimento não possui (aos olhos mais ingênuos) estreita conexão com a profissão escolhida. Questionar nunca é um erro, e sua pertinência é tão clara quanto o Sol, mas o questionamento que já possui em si uma resposta que invalida o próprio questionamento é desprov...

Sobre o "PL da Devastação"

Por Hiran Mauá Professor e Advogado Mestre em Geografia (UFSCar) Especialista em Relações Internacionais (FESPSP) Na triste noite de 21 de maio de 2025, o Senado Federal aprovou, por 54 votos a 13, o Projeto de Lei n.º 2.159/2021, que estabelece a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. A origem do projeto remonta a 2004, quando o então deputado federal Luciano Zica (PT-SP) apresentou o PL n.º 3.729/2004, com o objetivo de consolidar normas para o licenciamento ambiental no Brasil. À época, a proposta era vista como um avanço no sentido das políticas ambientais, especialmente quanto ao fortalecimento técnico e à padronização de procedimentos, preservando o princípio da precaução (que impõe a escolha por medidas preventivas e mais seguras sempre que houver risco ambiental ou incerteza científica) e os direitos socioambientais. Após um cochilo legislativo de quase vinte anos na câmara baixa, o projeto foi retomado em 2021 sob nova relatoria, agora do deputado federal Kim Kataguiri (União-S...

Linguagem jurídica: a primeira barreira do estudante de Direito

Por  Hiran Mauá Professor e Advogado Mestre em Geografia (UFSCar) Especialista em Relações Internacionais (FESPSP) A linguagem técnica do Direito é um grande desafio para quem ingressa em seu estudo. Os primeiros meses — quiçá anos — de um curso de bacharelado em Direito podem tormentosos pela incompreensão do texto que se encontra em leis, doutrina e jurisprudência. Essa barreira linguística, que é um longo ritual de iniciação no mundo jurídico, pode ser frustrante. Muitos dos alunos recém-chegados deparam-se com um vocabulário estranho, uma estrutura argumentativa altamente formal e textos truncados. O impacto inicial desse choque linguístico pode ser desestimulante e gerar um sentimento de inadequação. A dificuldade em compreender textos legais, doutrinas e decisões judiciais, muitas vezes, impede uma melhor apropriação do conhecimento jurídico, tornando o aprendizado mais superficial, dogmático e distante da realidade social. Que atire a primeira pedra o atual profissional do ...

Sobre os EUA - II - A crise de confiança na Aliança Ocidental

Por  Hiran Mauá Professor e Advogado Mestre em Geografia (UFSCar) Especialista em Relações Internacionais (FESPSP) As recentes tratativas entre Donald Trump e Vladimir Putin para negociar um acordo de paz para a Guerra da Ucrânia têm causado forte preocupação entre seus aliados da OTAN. Durante a campanha presidencial, Trump repetia o chavão de que encerraria rapidamente a guerra e que os gastos militares dos EUA no apoio à Ucrânia eram injustificáveis. Obviamente, a única forma de cumprir o prometido era cedendo à Rússia, que vem em momento de avanço no campo de batalha e, portanto, posição de força na mesa de negociações. Se tal acordo prosperar, em qualquer termo que seja, é vitória russa. Ao excluir das negociações a Ucrânia (simplesmente o país atacado) e países europeus da OTAN (alguns dos quais foram grandes financiadores da defesa ucraniana), Trump mostra-se servil a Putin, solapa aliados tradicionais e condena um país que acreditou nas promessas estadunidenses. Trata-se de...

Sobre os EUA - I - Donald Trump e Estados Unidos - Decadência ou Reviravolta?

Por Hiran Mauá Professor e Advogado Mestre em Geografia (UFSCar) Especialista em Relações Internacionais (FESPSP) A força ideológica que a segunda eleição de Donald Trump representa no mundo atual é de assustar àqueles que, assim como eu, veem no mandatário estadunidense uma tipo de pessoa e de visão de mundo dos mais repulsivos. Verdade seja dita, Donald Trump nunca enganou sobre como pensa - e mesmo assim foi eleito, duas vezes. Buscando uma análise de projeção, é muito difícil prever o que Trump representará na geopolítica e no sistema internacional, pois é na imprevisibilidade e na ameaça do caos que seu jogo se torna envolvente. Mas é possível, por hipótese, que Trump represente para os Estados Unidos um momento histórico de decadência - mais um ato de força de um país ferido que uma grande reviravolta capaz de fazer a América great again . É evidente que os EUA são, por muito, os líderes hegemônicos do atual sistema internacional e os principais arquitetos de uma ordem que vi...